Andy Warhol 16mm - Jonas Mekas
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Andy Warhol 16mm - Jonas Mekas

Era a primavera de 1964. Eu tinha acabado de publicar uma nova edição da revista Film Culture. Havia pilhas dela no número 414 da Park Avenue South, em Manhattan. A Park Avenue soa como um lugar muito rico. Mas isso era na Park Avenue South, na altura da Rua 28. Nada rico. Era uma área de lanchonetes e motoristas de táxi. A cafeteria Belmore ficava logo do outro lado da rua.

O número 414 da Park Avenue South era o meu apartamento/loft; o escritório da FilmMakers’ Cooperative; o escritório da revista Film Culture; e um point de cineastas underground, poetas, pessoas em trânsito. Bob Kaufman, Barbara Rubin, Christo, Salvador Dalí, Ginsberg, LeRoi Jones, Corso, George Maciunas, Warhol, Jack Smith, você podia encontrá-los lá. O único lugar privado que ainda sobrava pra mim era bem no fundo, onde ficava minha mesa de montagem. Eu dormia embaixo da mesa de montagem enquanto as festas rolavam.

De qualquer forma, uma nova edição da Film Culture tinha saído e eu pedi a John Palmer, um jovem cineasta de 18 anos que tinha acabado de chegar de Boston e se instalado em Nova Iorque, ou melhor, no meu loft, para ajudar a carregar sacolas cheias de revistas para o correio. O correio mais perto era no Empire State Building.

Enquanto carregávamos nossas pesadas cargas, o Empire State Building era nossa estrela de Belém: ele estava sempre lá, à nossa frente, nos guiando....

De repente, nós dois paramos. Tínhamos que parar e admirar o Empire State Building. Eu não lembro quem foi que falou, se John ou eu mesmo, ou nós dois ao mesmo tempo: “Não é o máximo? É um perfeito filme do Andy Warhol”
“Porque você não fala isso pro Andy? ”, perguntei.
Eu tinha acabado de apresentá-lo ao Andy e ele estava ajudando com pequenos serviços na Factory.
“Vou falar”, ele falou.
No dia seguinte, ele me liga.
“Andy está muito empolgado pra filmar Empire. Você pode ajudar a gente? Precisamos de uma câmera que possa rodar por muitas horas.”
OK”, eu disse.
Eu aluguei uma Arri e peguei um monte de filme. No sábado 25 de julho nos juntamos no escritório da Fundação Rockefeller. O escritório era comandado por Henry Romney, um amigo de Andy. E lá estávamos nós, no 41o andar do prédio da Time-Life. Eu preparei a câmera e enquadrei o Empire State. Eram 20h, início da noite. Andy estava lá para ajustar o enquadramento. Ele deu uma olhada no visor e disse: “tá ótimo, vai em frente.”

Apertei o botão e a câmera iniciou.

Tínhamos muita cerveja e alguns biscoitos. Então todos nós – umas seis pessoas – Andy, John Palmer, Romney, Gerard Malanga, minha namorada Marie e eu – relaxamos e nos instalamos para uma longa noite, madrugada adentro. Não foi tão relaxante pra mim, no entanto, porque eu tinha que identificar os rolos, trocar o filme a cada 30 minutos e recarregar o chassi. Mas todos nós nos divertimos.

A estreia de Empire teve que esperar por quase um ano. A filmagem estava pronta, e sentimos que era aquilo ali. Sabíamos o que era, que aparência teria, por que assistir? Ainda por cima, era um período muito, muito agitado dos anos 60, não parávamos de fazer coisas novas, e não tínhamos tempo de ver o que tínhamos feito ontem. Adiante, adiante avançávamos!

Então foi apenas no dia 6 de março de 1965 que Empire foi projetado pela primeira vez. A estreia foi no City Hall Cinema, um velho cinema na extremidade de Manhattan que estava prestes a ser demolido, que eu tinha alugado para as projeções da Film-Makers’ Cinémathèque.

Vieram umas 200 pessoas, mas elas foram saindo, uma por uma. Ainda assim, muitas horas depois tinha pelo menos cinquenta pessoas, com cerveja e sanduíches, e todo mundo se divertia. Andy também estava lá.

Neste julho último, no trigésimo aniversário do filme, eu o assisti novamente no Anthology. Tínha umas cinquenta pessoas. Cinco ou sete ficaram até o fim.

O filme parecia melhor do que nunca. Mesmo hoje, trinta anos depois, ele continua sendo uma das afirmações estéticas mais radicais do cinema.

O filme começa bastante calmo. Sim, quase nada acontece nele – quer dizer, nada no sentido usual, convencional, de quem assiste a um filme. Algumas luzes, arranhões na película. O filme continua, a expectativa começa a aumentar: o que vai acontecer agora, talvez nunca aconteça nada. Eu tinha me esquecido completamente do que acontece no filme. Eu estava sentado lá, cheio de expectativa em relação ao desconhecido. Acho que não vai acontecer nada...

Uma hora depois, de repente: um momento extático! Todo o Empire se acende! Que momento! Que êxtase visual! A audiência irrompe em aplausos...

Mais tarde, por volta de seis horas depois, quando todas as luzes se apagam de repente, surpreendentemente o Empire ainda está lá! Está tudo gravado profundamente na memória de nossas retinas, ainda vemos todas aquelas luzes, mesmo no escuro da noite...

Depois eu fiquei pensando por que, naquele dia, eu e John Palmer olhamos para o prédio do Empire State e dissemos: “Ah, esse é um filme de Andy Warhol!”

Em 1964, Andy já havia se estabelecido como um celebrador de imagens icônicas reconhecíveis publicamente, imagens que todo mundo via todos os dias e que já estavam impressas em nossas mentes, em nossos olhos. Andy era atraído por tais imagens. Fossem elas pessoas – Elizabeth Taylor, Jackie Onassis, Mao, Elvis Presley – ou objetos, como a cadeira elétrica, o Empire – ele era atraído por estas imagens de proporções míticas. Não para ganhar dinheiro com elas, não; porque ele não precisava de dinheiro. Ele era obcecado com imagens. Como a discoteca da Rua 54. Ele tinha de estar lá. Também se tratava de um lugar mítico. Não para dançar, porque nunca o vi dançando. Ele, na verdade, normalmente nem entrava: na maior parte do tempo, ficava no saguão com sua Polaroid, clicando, clicando. Ele precisava registrar aquelas pessoas bonitas. Ele era o perfeito espectador ou observador. Não um voyeur, exatamente, mas um olho que vê e registra.

Acho que foi durante o inverno de 1962-63 que encontrei Andy um dia na Segunda Avenida, na baixa Manhattan. Ele me perguntou pra onde eu ia. Eu disse que estava indo a um show de LaMonte Young. Ele disse que se juntaria a mim, e então nós fomos. LaMonte tocou uma daquelas peças extremamente longas, de quatro ou seis horas de variação em cima de uma única nota. Andy ficou sentado durante toda a peça.

Andy já fazia fotografias em série, repetições da mesma imagem. Alongando o tempo. Jackson MacLow já havia escrito seu script/nota sobre filmar uma árvore por vinte e quatro horas. Empire já estava no ar. Andy não era um artista amador, ele era muito informado sobre o que acontecia nas artes. Pode-se dizer que Empire era um diálogo seu com outros artistas de vanguarda do seu tempo. Era um diálogo com os minimalistas, com os conceituais, com os artistas do tempo real e, ao mesmo tempo, era uma celebração estética da realidade. E, como tal, ele nunca irá nunca envelhecer, permanecerá sempre vivo e único.

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